Lillium e a Virada da Ampulheta - Prólogo

Lillium e a Virada da Ampulheta - PRELÚDIO

           (Fotografia por Nona Limmen)

O Mensageiro do Dia voava sobre a Floresta Negra, as luzes de Camelot sumindo no horizonte, sendo dominadas pela imensidão negra das Paudha. Seu ritmo era frenético, ele procurava alguém enquanto sobrevoava por todos os cantos como uma mosca, tomando cuidado para que nenhuma das árvores malditas o puxasse pelo pé para dentro de seus cascos.

Para alguém otimista e bem humorado, Ikki não compartilhava com essas suas características no momento, com seu rosto fechado em uma carranca ainda mais medonha por causa de seus cabelos brancos escorridos pela água da chuva. Ele sabia que era seu irmão que devia ter vido para essa missão, afinal ele é o Mensageiro da Noite. Suspirou, não era exatamente a hora de reclamar, ainda mais em uma situação urgente como aquela.

A chuva torrencial não ajudava em sua busca, estava escuro e apenas o símbolo de Gemini brilhava em amarelo vívido nas costas de sua mão direita, não que fosse uma boa fonte de iluminação, o Mensageiro não enxergava meros dois palmos a sua frente. Por sorte, ele não perdeu o pequeno mapa que a deusa Lua o havia lhe dado. Com dificuldade finalmente alcançou sua bolsa, franziu o cenho.

-Merda, essa me custou caro... - A bolsa estava arruinada, e não por menos, a viagem abrupta não fez bem para o veludo delicado, menos ainda para os lindíssimos detalhes de seda. A paciência do Mensageiro estava acabando, estava há dois minutos parado no ar com a mão enfiada na bolsa e sem sucesso em achar o mapa. Um raio partiu o céu quase o acertando, o homem gritou em uma voz que parecia mais pertencer a uma garotinha do que a ele enquanto voava para longe.

Com todo o acontecimento, Ikki finalmente pôs suas mãos pálidas no mapa, rindo mais de desespero do que de alegria. Piscou, clicando no botão de início observando a tela azul se formar, mostrando o exato caminho até seu destino. Com uma rapidez impressionante, o Mensageiro seguiu de acordo com o mapa para chegar a um local com mais árvores, a beira de um precipício.

-Quê?! - Exclamou, balançando o mapa de maneira escandalosa, a cabeleira prateada se arrepiando mesmo por baixo da capa amarela que estava usando. E, mais uma vez, o Mensageiro piscou em realização. Toda aquela situação tinha o feito esquecer que era um mágico. Com mais calma, olhou novamente para o lugar que o mapa havia marcado para ele.

Magia.

É claro, o deus que estava procurando não iria se deixar ser encontrado tão fácil, ainda mais depois dos rumores que criaram sobre ele. Além disso, não gostava de ser incomodado, Ikki aprendeu isso da pior forma.

Ele sacudiu a cabeça branca, já estava desviando o foco de seu dever. Com a delicadeza de uma pluma, o Mensageiro pousou no chão, olhando para a gigantesca ilusão mágica à diante. Deu três passos para frente olhando para uma pequena rachadura brilhante no tronco, pondo sua mão pálida e encharcada na superfície estranhamente macia. Ele estremeceu.

Mas é claro, uma fechadura de permissão. Sorriu, tirando uma madeixa grossa da frente do rosto. Com o símbolo amarelo em sua mão brilhando mais que nunca, apertou mais a mão contra a rachadura. Relutante. Esse deus realmente não gostava de visitas. O símbolo brilhou ainda mais, a mágica fez sua capa de chuva flutuar levemente.

Assim como a magia começou, parou subitamente. O homem piscou dementado e olhou ao redor em desconfiança, ele sabia que aquelas coisas estavam o observando, na verdade, ficou impressionado que nenhuma tentou o puxar ou alguma das bestas noturnas ter saído do chão preparada para dilacerar seu corpo quase translúcido.

No mesmo momento de uma trovejada, a ilusão começou a desaparecer, dando vista a um gigantesco castelo negro. Ikki engoliu um seco. Maléfico era a melhor forma de descrever a construção imponente, as torres de aparência afiada se erguiam como estacas em direção ao céu lúrido, tão altas que eram cercadas por nuvens levemente escarlates. Os portões de aparência igualmente maligna se abriram em um ranger insuportável, similar ao grito de uma bruxa.

Sem pensar duas vezes, ele logo se apressou para dentro, observando o caminho de pedra enquanto o portão se fechava e a ilusão se formava novamente. Enquanto olhava ao redor, sentiu uma presença atrás de si, um arrepio lhe percorreu a espinha. Ikki rapidamente se virou para trás para encontrar uma das criaturas mais horrendas que já tinha visto.

Era um Catus, mas diferente de todos que já tinha visto. Este não possuía pelos, a pele enrugada por baixo da capa negra estava deformada em uma carranca horrível, seria esse um dos servos do castelo ou uma alma penada vinda direto dos confins do submundo para assombrá-lo? O Catus fez um leve movimento com a mão, fazendo o Mensageiro pular em sobressalto. Arrependeu-se rapidamente, sua reação fez a carranca da criatura ficar ainda pior, formando uma feição de nojo.

- Minha mestre o está esperando - A voz era ríspida, mas estranhamente fina. O de cabelos prateados deu um sorrisinho zombeteiro enquanto seguia o Catus medonho até as portas gigantescas de madeira escura do castelo, a voz parecia ser pertencente a um daqueles diabinhos que seu irmão tanto gostava de perturbar. Isto é, se essa coisa não era um deles.

A criatura estendeu a mão rosa e enrugada até a gigantesca argola do que parecia ser ferro, batendo duas vezes. Ouve os típicos sons de fechaduras abrindo-se, e, enquanto era aberta, Ikki pode ver outra criatura horripilante puxando a porta pesada. Dessa vez era um Leporidae, comprido e de aparência torta, os olhos vermelhos o olhavam fixamente enquanto se aproximava. O Mensageiro se alertou com a aproximação, mas a outra criatura, que possuía orelhas grandes demais para o seu rosto, apenas tirou sua capa de uma forma surpreendentemente cortês.

No processo, o homem olhava ao redor, a escadaria tão gigantesca e escura quanto o castelo visto de fora, se elevava até, ele imaginava, dois corredores. Notou também a falta de iluminação do hall de entrada, na verdade a ausência, o candelabro estoico que se pendurava no teto envolto de molduras no mínimo sinistramente questionáveis estava com todas as velas apagadas. Quando ele tornou a olhar para frente, ergueu as sobrancelhas para mais três figuras postas no final das escadarias. Questionou-se silenciosamente se já estavam lá e passados despercebidos ou se surgiram tão rapidamente sem fazer ao menos um ruído.

Parou alguns bons segundos para analisá-los. Avcis. Com suas caudas longas e maleáveis e o ferrão escorpiônico alojando-se no fim e os quatro olhos brilhantes de pupilas afiadas. Pareciam ser todos machos, apesar da estatura incomumente alta para um Avci masculino, um em especial, que parecia ter mais de dois metros, remendado com costuras cirúrgicas como se fosse uma boneca feita à mão, o trio era ridiculamente diferente.

Antes que pudesse notar mais alguma coisa, o candelabro, assim como as outras tochas, acendeu-se iluminando todo hall de entrada em uma luz branca mostrando com mais clareza a decoração gótica do lugar.

Ikki ouviu a porta se fechar em um baque estrondoso e seu braço ser envolvido delicadamente, como vira nas ruas as damas de prazeres fazerem com seus clientes enquanto os levava para os quartos. Olhou para o motivo do aperto, um humano de aparência angelical, com três singelas pintinhas espalhadas pelo seu rosto delicado. Os cílios longos e grossos mexeram-se enquanto os olhos âmbar moviam-se na direção do Mensageiro.

- Venha, vou lhe mostrar onde a mestre se encontra - E com um sorriso adorável, levou o visitante pelas as escadeiras escuras.

Enquanto admirava os cabelos longos e ondulados do jovem, Ikki sentia os olhares dos três Avci em suas costas, e, quando fez a curva para um corredor, teve certeza que viu um mostrar as presas para ele.

Durante a sua passagem nos longos corredores obscuros do castelo, tratou de não apenas admirar a beleza jovial do garoto que o estava guiando, mas também mover seus olhos curiosos pelo local. Era sinistro, mas elegante. De certa forma, até acolhedor em seu interior. Em sua passagem por um dos corredores, o Mensageiro engasgou ao ver um quadro de seu mestre pendurado entre vários outros quadros.

- O senhor está bem? - Seu guia o olhou pelo ombro, piscando lindamente em confusão.

- Estou sim, sim... - Teria sido um engano? Devia ser, estava muito aloprado diante de toda a situação, Ikki já não era um sujeito de traços calmos, a algazarra acontecida o deixou ainda mais inquieto.

Com um pequeno sorriso em seus lábios rosados, o guia voltou a andar, subindo em uma escada em formato de caracol, seus passos leves e pequenos como os de um passarinho.

No término da escada, a mão delicada do jovem o puxou para frente de uma porta escura, estavam em uma das torres do castelo. O Mensageiro analisou a porta, com a madeira ornamentada em vários desenhos das criaturas da noite, principalmente morcegos e escorpiões, que davam a impressão de estarem se movimentando entre os galhos e folhas esculpidas na madeira. O guia deu três batidas rítmicas na porta.

- Entre - A voz feminina e persuasiva retumbou por trás da porta maciça, e com uma delicadeza inumana o jovem angelical a abriu, sem fazer um ruído. Levou os olhos até Ikki, movendo lentamente a cabeça para dentro do quarto escuro, iluminado pelo fogo fraco da lareira. O homem deu um pequeno pulo, entrando no quarto como um rato arrepiado.

E, mais uma vez, ouviu a porta se fechando. Por algum motivo, sentiu-se nervoso sozinho com aquele sujeito. Ikki moveu seus olhos violetas para a grande poltrona direcionada a lareira. Era colorida de um tom elegante de vermelho, como muitas coisas nesse castelo. Pode notar a mão no final do braço do assento, segurava uma taça contendo um liquido que não conseguiu identificar. Com certeza estava se preparando para descansar, a manga de sua blusa de linho branco era larga e ia até o seu pulso, onde babados bem decorados se formavam. No fim dos babados encontrava-se a sua mão, de uma cor purpúrea acinzentada e garras afiadas nas pontas dos dedos sutis, iluminados pelo ardor alaranjado do fogo na lareira.

- Aproxime-se, mensageiro - Mais uma vez a voz que soava como música mas ao mesmo tempo, cínica, soou pelo quarto. Como se estivesse hipnotizado, o de cabelos prateados se aproximou de sua colega o suficiente para ver seu rosto requintado, de traços rebuscados e afiados. Seus quatro olhos de um amarelo-âmbar escuro refletiam o fogo, nem sequer moveram-se para fitar Ikki. - Vamos, anuncie as noticias para mim - Havia um tom mal humorado em sua voz, franzindo levemente o cenho, mostrando ainda mais as presas incisivas.

Como se ganhasse vida própria novamente, a figura branquíssima encheu seus pulmões em uma tentativa de afastar o nervosismo.

- O Rei... O Sol adormeceu e não quer se levantar -

P.S: Voltamos, e com uma nova história que dessa vez vamos terminar. - Antares

P.S: Hmm que delícia, passar bem galera. Aproveitem - Virginis


Comentários

  1. "O homem gritou em uma voz que parecia mais pertencer a uma garotinha do que a ele enquanto voava para longe." TADINHO AUSHSUH
    Chegou o bonde do castelo aê
    Hummm eu tô muito ansiosa pelo próximo! Vocês conseguiram me deixar bem curiosa sobre essa história! 'u'
    Aguardando por mais!

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    1. LKKKKKJHJKKK, tadinho aí ai
      Mas é claro, a família Addams alternativa não podia faltar, e que bom q a gente atiçou tua curiosidade ksksk >:]

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  2. Vocês estão escrevendo detalhadamente bem, estou orgulhosa *happy
    As cenas que imaginei foram bem mágicas e impressionantes, faz sentido o Ikki ter ficado impressionado também akskak

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    1. Aah tankis *happy too*
      LLKKKKKKKKKK o Ikki eh meio bobo, é um mágico e ainda se impressiona. Talvez tenha sido por outro motivo, quem sabe

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    2. "Nós" Kkklkkk, esse prólogo foi uglei que fez cheguei a me emocionar de tão lindo. Mas, muito obrigada Kaks ♡♡

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